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quinta-feira, 6 de maio de 2010

JURID - Reexame necessário. Apreensão de veículo sem motivação. [06/05/10] - Jurisprudência


Reexame necessário. Ação ordinária de indenização por Responsabilidade civil. Apreensão de veículo sem motivação.

Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT.

QUARTA CÂMARA CÍVEL

REEXAME NECESSÁRIO Nº 93910/2009 - CLASSE CNJ - 199 - COMARCA DE JUARA

INTERESSADO: DIONIZIO LISBOA DE SOUZA

INTERESSADO: DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DE MATO GROSSO - DETRAN/MT

Número do Protocolo: 93910/2009

Data de Julgamento: 20-04-2010

REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO POR
RESPONSABILIDADE CIVIL - APREENSÃO DE VEÍCULO SEM MOTIVAÇÃO - ENTREGA DO VEÍCULO PARA TERCEIRA PESSOA NÃO AUTORIZADA - DANOS MATERIAIS E MORAIS COMPROVADOS - SENTENÇA RATIFICADA.

Comprovados os danos materiais e morais decorrentes da apreensão desmotivada do veículo do autor e a sua entrega para terceira pessoa não autorizada, a responsabilidade civil do órgão estatal se impõe.

RELATÓRIO

EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA Egrégia Câmara:

Trata-se de Reexame Necessário da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Juara/MT que, nos autos da Ação Ordinária de Indenização por Responsabilidade Civil nº 150/96, movida por Dionizio Lisboa de Souza em face do Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso - DETRAN/MT, julgou parcialmente procedentes os pedidos.

O Magistrado a quo indeferiu o pedido de indenização por lucros cessantes, condenou o DETRAN/MT à reparação dos danos morais no valor de R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), bem como ao ressarcimento dos danos emergentes, decorrentes da perda do veículo, determinando que o valor seja liquidado mediante arbitramento.

O Juiz sentenciante ainda consignou que os valores deverão ser corrigidos monetariamente a partir do efetivo prejuízo, acrescidos de juros moratórios à razão de 1% (um por cento) ao ano, a contar do evento danoso.

Por fim, condenou o DETRAN/MT ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

Não houve interposição de recurso voluntário, conforme se depreende das certidões de fls. 155 e 156.

Instada a se manifestar, a douta Procuradoria Geral de Justiça opina pela ratificação da sentença reexaminada, consoante se vê do parecer de fls. 177/180, da lavra do Dr. José Zuquetti.

É o relatório.

À douta revisão.

PARECER (ORAL)

O SR. DR. PAULO FERREIRA ROCHA

Ratifico o parecer escrito.

VOTO

EXMA. SRA. DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA (RELATORA)

Egrégia Câmara:

Como relatado, os autos foram remetidos para este Sodalício para o Reexame Obrigatório da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos ínsitos na Ação Ordinária de Indenização por Responsabilidade Civil que Dionizio Lisboa de Souza move em face do Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso - DETRAN/MT.

Consoante se extrai da petição inicial, a ação foi ajuizada porque, em 06-10-1991, o autor teve seu veículo, marca Toyota Bandeirante, modelo 81, apreendido por Policiais Militares, sem nenhuma explicação plausível.

O DETRAN/MT entregou referido veículo para terceiro e o autor somente tomou conhecimento do fato após ser autuado, em 08-01-93, pela autoridade competente.

Narra ainda a peça madrugadora que, em 10-08-1994, segundo registros contidos no sistema de Roubos e Furtos de Mato Grosso, o veículo continuava em nome do Autor, bem como que existia multa imposta pela Polícia Rodoviária Estadual, no valor de R$74,72 (setenta e quatro reais e setenta e dois centavos).

Assevera o autor que esses fatos geraram enormes prejuízos, tanto de ordem moral como material. O primeiro, consubstanciado no fato de que para a sociedade passou-se a impressão de que o autor era ladrão de automóveis. Os danos materiais, por sua vez, decorreram da perda do seu veículo automotor.

Após a análise do conjunto probatório, o Magistrado condenou o DETRAN/MT a ressarcir o autor dos prejuízos de ordem material, decorrentes da perda do automóvel, bem como a indenizá-lo pelos danos morais experimentados.

Pois bem. O artigo 37, parágrafo sexto, da Constituição da República, assim dispõe:

"Art. 37 - [...]

[...]

Parágrafo sexto - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."

Da leitura do dispositivo, é possível verificar que o legislador constituinte consagrou a teoria da responsabilidade objetiva, também denominada de teoria do risco administrativo, segundo a qual a obrigação de indenizar prescinde da comprovação dos elementos subjetivos de dolo ou da culpa.

Desse modo, a princípio, o Estado, as concessionárias e permissionárias de serviço público, respondem pelos atos de seus agentes, na medida em que a vítima demonstra a extensão do dano e o nexo causal entre a conduta do agente e o dano sofrido. Tal responsabilidade decorre, portanto, de dois requisitos, quais sejam: comprovação do dano e nexo causal.

A responsabilidade, nestes casos, somente não será do Estado quando este demonstrar existência de uma das causas de exclusão, como a culpa exclusiva da vítima, o caso fortuito ou a força maior.

Segundo Hely Lopes Meirelles:

"O risco administrativo não significa que a administração deve indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular; significa apenas e tão-somente que a vítima fica dispensada da prova da culpa da Administração, mas esta poderá demonstrar a culpa total ou parcial do lesado no evento danoso, caso em que se eximirá integral ou parcialmente da indenização." (Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, Ed. RT, 4ª ed., 199p, pp. 502/503).

Na hipótese, nos termos do que foi exposto alhures, o dano teria sido causado pela conduta de Policiais Militares que procederam à apreensão do veículo de propriedade do autor, inobstante a inexistência de qualquer motivo para a prática de tal ato, bem como pelo fato do DETRAN/MT ter efetuado a entrega o veículo para terceira pessoa, à sua revelia e que se manteve na posse do bem.

Compulsando detidamente os autos, verifica-se que, em 06-10-1991, o veículo foi efetivamente apreendido; todavia, não há no Auto de Apreensão, acostado às fls. 28, o motivo pelo qual se deu a apreensão, o que caracteriza o excesso ou abuso por parte dos agentes públicos.

Sobre o tema, oportuna a lição de Miguel Seabra Fagundes, quando afirma que:

"Por abuso de poder se há de entender tudo o que diga respeito à infração das regras de competência. Desde a sua violação frontal, pela prática de ato totalmente alheio ao âmbito de atribuição do agente (usurpação do poder no nosso direito penal e da classificação teórica dos graus de incompetência no direito administrativo - cf. n. 31), até as exorbitâncias de uma competência realmente existente, sejam ostensivas (busca realizada pela autoridade policial com arrombamento desnecessário - CP, artigo 350, IV) ou se disfarcem nas aparências de atos legítimos (expulsão de estrangeiro, por motivos outros que não a nocividade à ordem pública)." ("O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário", Ed. Saraiva, 6ª ed., p. 231).

Também é possível verificar que após a apreensão, sem que fosse lavrado qualquer documento de liberação, o veículo voltou a trafegar no Estado, tanto que foi aplicada multa pela Polícia Rodoviária Estadual, conforme se vê às fls. 32/33.

Tais provas corroboram as afirmativas do Autor de que o DETRAN/MT entregou seu veículo para terceiro não autorizado, fato não desconstituído por provas produzidas pelo órgão estadual.

Assim, no caso reexaminado, somente restaria afastada a responsabilidade civil do DETRAN/MT, caso este demonstrasse qualquer excludente de responsabilidade. Porém, nada comprovou.

Com o exposto, tenho que o decisum sob reexame deve ser mantido, uma vez que restou comprovado o dano material.

Quanto ao valor da indenização, deverá ser fixado por arbitramento, pois somente um profissional qualificado tem a capacidade para aferir o real valor do bem, uma vez que o autor deverá ser ressarcido consoante o valor do veículo à época da apreensão.

No que se refere aos lucros cessantes, a sentença reexaminada também não merece reparos. Isto porque, como ressabido, os lucros cessantes constituem aqueles valores que a parte deixou de auferir em decorrência de evento danoso, sendo certo que para o seu deferimento não basta simples prova de que o veículo foi apreendido e entregue à terceiro, mas que efetivamente deixou de auferir ganhos em decorrência do fato.

A respeito do tema, valiosa a lição de Arnaldo Marmitt:

"Para serem deferidos os lucros cessantes, mister a sua prévia comprovação. Sem prova de sua efetiva ocorrência, não poderão jamais ser concedidos a quem quer que seja. Não teria o menor cabimento condenar alguém ao pagamento de perdas e danos inexistentes, ou sem prova cabal de sua existência." (A Responsabilidade Civil nos Acidentes de Automóvel, 3ª ed., 1998, p. 123).

Assim, como do conjunto probatório não ressai qualquer prova capaz de demonstrar os valores que deixou de auferir, a sentença também merece ser ratificada neste capítulo.

No que tange à indenização pelos danos morais, é devida, pois a sua prova se limita à injuridicidade do ato praticado, senão, vejamos:

"Em se tratando de responsabilidade civil objetiva, não se perquire acerca da culpa do agente, bastando que estejam comprovados nos autos o dano e o nexo de causalidade. Ocorrendo abuso de poder por parte da administração, ou abuso de autoridade, por parte do seu agente, poderá ensejar ao ofendido o direito à reparação de seus direitos individuais atingidos. O valor da indenização por danos morais deve servir não apenas para minorar o sofrimento da vítima, mas, também, como fator de desestímulo ao agente, evitando-se a prática de novos atos lesivos." (TJMG, Apc. 1.0105.00.001084-0, Rel. Desembargador Edivaldo George dos Santos, 7ª Câmara Cível, DJ 23-04-2004).

Com efeito, é inquestionável que a apreensão desmotivada do veículo do autor e a sua entrega a terceiro provocou desgosto, aborrecimento e insegurança.

Consequentemente, o DETRAN/MT deve suportar o ônus indenizatório também sobre esse prisma.

Quanto ao valor arbitrado pelo Magistrado de origem, R$2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), também deve ser mantido, uma vez que para a fixação desse valor o Julgador deve examinar as circunstâncias específicas de cada caso concreto, arbitrando-o de acordo com sua conclusão lógica e criteriosa, buscando sempre o termo justo e razoável.

Ademais, é ressabido que o valor da indenização tem o duplo efeito: reparar o dano, compensando a dor infligida à vítima e punir o ofensor, para que não reitere o ato contra outra pessoa.

Sendo assim, tenho que o valor tal como fixado no decisum, mostra-se adequado ao caso.

Diante de todo o exposto, em consonância com o parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça, ratifico in totum a sentença reexaminada.

É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. MÁRCIO VIDAL, por meio da Câmara Julgadora, composta pela DESA. CLARICE CLAUDINO DA SILVA (Relatora), DRA. VANDYMARA G. R. P. ZANOLO (Revisora convocada) e DES. MÁRCIO VIDAL (Vogal), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, RATIFICARAM O ATO SENTENCIAL SOB REEXAME, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA.

Cuiabá, 20 de abril de 2010.

DESEMBARGADOR MÁRCIO VIDAL - PRESIDENTE DA QUARTA CÂMARA CÍVEL

DESEMBARGADORA CLARICE CLAUDINO DA SILVA - RELATORA
PROCURADOR DE JUSTIÇA




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