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segunda-feira, 10 de maio de 2010

JURID - HC. Tráfico de influência. Pedido de trancamento da ação. [10/05/10] - Jurisprudência


HC. Tráfico de influência. Pedido de trancamento da ação. Alegação de atipicidade da conduta e de inépcia.

Superior Tribunal de Justiça - STJ

HABEAS CORPUS Nº 146.038 - SP (2009/0169598-8)

RELATOR: MINISTRO OG FERNANDES

IMPETRANTE: LUIZ CARLOS MARANHÃO E OUTRO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: JOSÉ AUGUSTO FERREIRA DOS SANTOS

EMENTA

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE INFLUÊNCIA. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA E DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. IMPROCEDÊNCIA.

1. Segundo a iterativa jurisprudência desta Corte, o trancamento da ação penal, pela via do habeas corpus é medida excepcional, só admissível quando despontada dos autos, de forma inequívoca, a ausência de indícios de autoria ou materialidade delitiva, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade.

2. A peça vestibular preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, descrevendo, com todas as suas circunstâncias, a existência de crime em tese, bem como a respectiva autoria, com indícios suficientes para a deflagração da persecução penal.

3. A exordial acusatória narra que o paciente assumira o compromisso, com terceira pessoa, em troca de proveito econômico, de tomar providências, junto à Prefeitura do Município de Santo André, para que fosse efetuado o pagamento do crédito de determinada empresa.

4. Perde relevância o momento da obtenção da vantagem econômica indevida, já que o delito previsto no art. 332 (tráfico de influência) é de ação múltipla ou conteúdo variado, contentando-se, nas modalidades formais, com a simples solicitação, exigência ou cobrança do proveito, em troca da suposta influência em ato funcional.

5. Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após voto vista do Sr. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP) denegando a ordem, e os votos dos Srs. Ministros Haroldo Rodrigues, Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura no mesmo sentido, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília (DF), 13 de abril de 2010 (data do julgamento).

MINISTRO OG FERNANDES
Relator

HABEAS CORPUS Nº 146.038 - SP (2009/0169598-8)

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO OG FERNANDES: Impetra-se o presente habeas corpus em favor de José Augusto Ferreira, apontando como coator o Tribunal de Justiça de São Paulo, que denegou o writ lá formulado.

O paciente foi denunciado, com outras pessoas, por tráfico de influência (art. 332 do Código Penal), pretendendo, em síntese, o trancamento da ação por atipicidade da conduta e inépcia formal da denúncia.

Segundo a acusação, o paciente teria ajustado com terceira pessoa o recebimento de vantagem econômica, a pretexto de influenciar o Prefeito de Santo André/SP a efetuar o pagamento de débito do Município a determinada empresa.

No que diz respeito à tese de atipicidade, sustenta a impetração que a conduta do paciente não se ajusta ao tipo que lhe é imputado porque o recebimento da dita vantagem econômica, segundo se extrai da denúncia, operou-se após a prática do ato funcional. Enfatiza, nesse sentido, que "não haverá crime se a vantagem for obtida pelo agente quando o ato funcional já tiver sido praticado".

No que concerne à alegação de inépcia, afirma que "em nenhum momento a inicial diz que o paciente afirmou a Manoel que ele, paciente, exerceria influência sobre algum servidor público para a prática de qualquer ato, nem de que modo o faria".

Indeferida a liminar e prestadas as informações, o Ministério Público Federal opina pela denegação da ordem.

É o relatório.

HABEAS CORPUS Nº 146.038 - SP (2009/0169598-8)

VOTO

O SR. MINISTRO OG FERNANDES (RELATOR): Conforme relatado, o paciente foi denunciado, juntamente com outras pessoas, pela prática de tráfico de influência ("solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função" - art. 332, CP) em peça acusatória de seguinte conteúdo:

Consta dos inclusos autos de procedimento investigatório criminal em epígrafe que, entre agosto de 2001 e abril de 2002, nesta cidade de Santo André, JOSÉ AUGUSTO FERREIRA DOS SANTOS, RONAN MARIA PINTO e SÉRGIO GOMES DA SILVA, previamente conluiados e com identidade de propósitos à obtenção do mesmo resultado, obtiveram vantagem econômica para a empresa "Rovip S/A", a pretexto de influir em ato praticado por Celso Augusto Daniel, então Prefeito de Santo André - funcionário público -, no exercício da função.

Contrato entre "Enterpa" e Prefeitura

"Enterpa Engenharia S/A" - posteriormente sucedida pela "Enterpa Ambiental S/A" - mediante processos administrativos de licitação, na modalidade de concorrência pública, explorava serviços de coleta e transporte de resíduos sólidos e de resíduos de saúde, bem como operação e manutenção de aterro sanitário, no município de Santo André.

A partir de agosto de 1998, a Municipalidade deixou de efetuar o pagamento das faturas dos serviços prestados e, ainda, passou a efetuar o pagamento de outras com atrasos.

Visando o recebimento dos valores e, ainda, indenização, "Enterpa" ingressou com três ações em face da Prefeitura Municipal de Santo André. São elas:

a) nº 3129/99 - 1ª Vara Cível de Santo André (fls. 02/27 do anexo I), com contestação, em que a municipalidade pugnou pela improcedência do pedido (fls. 29/44 do anexo I).

b) nº 3023/99 - 4ª Vara Cível de Santo André (fls. 90/115 do anexo I), com contestação buscando acolhimento de preliminar para extinção do feito e improcedência no mérito do pedido (fls. 116/122 do anexo I).

c) nº 3224/99 - 4ª Vara Cível de Santo André (fls. 160/185 do anexo I), com contestação (fls. 186 do anexo I). Em audiência de tentativa de conciliação, em 30/10/00, não houve composição (fls. 124/125 do apenso I).

Consideradas as três ações, o valor total das faturas não pagas, devidamente corrigido, segundo a própria "Enterpa", era de aproximadamente R$ 6.400.000,00 (seis milhões e quatrocentos mil reais). A empresa ainda cobrava judicialmente, a título de perdas e danos, cerca de R$ 2.800.000,00 (dois milhões e oitocentos mil reais).

No transcorrer das referidas demandas, sobreveio, para homologação judicial, 29/08/01, acordo celebrado entre as duas partes, com a assinatura de representante da empresa "Enterpa" e dois Procuradores do Município de Santo André (fls. 75 do anexo I).

Simultaneamente, foi apresentado contrato de cessão de crédito para "Rovip S/A". Este documento foi assinado pelas partes celebrantes, que não foram qualificadas no referido instrumento particular, bem como pelo Prefeito Celso Augusto Daniel, na qualidade de anuente, e pela então Secretária de Assuntos Jurídicos, Marcela Belic Cherubine, na qualidade de testemunha (fls. 76/77 do anexo I).

Homologado o acordo, houve extinção dos processos, em 19/10/01 (fls. 79 do anexo I).

Forma de obtenção do acordo entre "Enterpa" e Prefeitura

Durante o curso das ações de cobrança e indenização, "Enterpa" era controlada pela holding "Sideco Brasil S/A", presidida por Manuel Basto Lima Junior.

Nesta mesma época, "Rotedali", contratada emergencialmente para operar os serviços antes prestados pela "Enterpa", tinha como sócio o gerente a "BVA Participações e Administração de Bens S/A." - cuja razão social foi posteriormente alterada, passando a denominar-se "Rovip S/A" - então representada por JOSÉ AUGUSTO.

JOSÉ AUGUSTO, após reunião com Manuel, em troca de recebimento de vantagem para sua empresa, se comprometeu a providenciar o quanto necessário para que a Prefeitura de Santo André efetuasse o pagamento do débito.

A esta altura, já era do conhecimento de JOSÉ AUGUSTO a relação de amizade e influência entre RONAN e SÉRGIO, bem como era do seu conhecimento a mesma relação de amizade e influência entre SÉRGIO e o então Prefeito Celso Daniel. Diante disto, JOSÉ AUGUSTO transmitiu o resultado da reunião a RONAN. Este, por seu turno, retransmitiu o plano para SÉRGIO. SÉRGIO, finalmente, providenciou o necessário para o assunto chegar ao Prefeito de Santo André, Celso Daniel, que aderiu ao plano.

Anote-se que SÉRGIO e RONAN já foram denunciados por formação de quadrilha, porque se associaram a outras pessoas, com o propósito de lesar a administração pública, mediante a prática de crimes de concussão e fraudes à licitação, inclusive em favorecimento da empresa "Rotedali", justamente, com a adjudicação dos contratos de coleta de lixo urbano e exploração de aterro sanitário, serviços antes prestados pela "Enterpa".

O acordo resultado das sucessivas reuniões entre estes participantes foi o comprometimento pela Municipalidade do pagamento de R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais), com o encerramento das ações em andamento.

Este valor seria dividido da seguinte forma: R$ 4.600.000,00 (quatro milhões e seiscentos mil reais) para a "Enterpa" e R$ 1.400.000,00 (quatro milhão e quatrocentos mil reais) para "Rovip".

Para materializar este pacto, foram confeccionados dois documentos (fls. 72/77 do anexo I). Um acordo entre "Enterpa" e o Município de Santo André, ficando este obrigado ao pagamento de R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais), em seis parcelas fixas mensais de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), diretamente à "Rovip" (fls. 72/75 do anexo I), a ser depositado em conta do Banco BVA, pertencente a JOSÉ AUGUSTO. E um contrato de cessão de crédito, onde aquele valor a receber de R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais) era transferido da "Enterpa" para "Rovip", pelo pagamento à vista de R$ 4.600.000,00 (quatro milhões e seiscentos reais).

Importante ressaltar que o acordo para o pagamento dos R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais) não obedeceu aos trâmites normais dentro da administração pública. Não foi precedido de nenhum procedimento administrativo que pudesse colher, dos procuradores do município e de outros com atribuição, parecer sobre sua viabilidade legal e financeira.

O referido documento foi elaborado por ordens do próprio Prefeito Celso Daniel e simplesmente chegou às mãos dos procuradores do município José Joaquim Jerônimo Hipólito e Paulo André Alves Teixeira com a ordem de assinatura.

Já a anuência à cessão de crédito feita pela "Enterpa" para "Rovip" foi assinada pelo próprio Prefeito Celso Daniel.

Com suas condutas, JOSÉ AUGUSTO, RONAN e SÉRGIO obtiveram vantagem de R$ 1.400.000,00 (um milhão e quatrocentos mil reais) para a empresa "Rovip". Isto a fim de influenciarem o Prefeito Celso Daniel a liberar o pagamento de dívida que estava sendo discutida em Juízo, no valor de R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais), para a empresa "Enterpa" que, então, não teria que aguardar o deslinde da ação recém proposta e a expedição do precatório.

Diante de todo o exposto, oferece DENÚNCIA contra JOSÉ AUGUSTO FERREIRA DOS SANTOS, RONAN MARIA PINTO e SÉRGIO GOMES DA SILVA, como incursos no art. 332, caput, c.c. o art. 29, ambos do Código Penal, requerendo que, recebida e autuada esta, sejam eles citados e interrogados, ouvindo-se as testemunhas a seguir arroladas, nos termos dos arts. 394/405 do Código de Processo Penal, até final sentença condenatória.

Objetiva a impetração o trancamento da ação por atipicidade, afirmando que "o inquérito provou que a obtenção da suposta 'vantagem' pela empresa 'ROVIP' (na aquisição do crédito da 'ENTERPA' contra o Município) foi posterior à celebração do acordo judicial entre a Municipalidade e a 'ENTERPA', ato funcional que já tinha sido praticado pelos agentes municipais antes de qualquer participação do paciente".

Sustenta, outrossim, que a denúncia é inepta porque não descreve qualquer afirmação do paciente no sentido de que procuraria influenciar ato de servidor público.

Não me parece, ao menos nos estreitos limites da via eleita, ser atípica a conduta do paciente. Isso porque a exordial acusatória narra que ele - José Augusto Ferreira dos Santos - assumira o compromisso com Manoel Basto Lima Junior, em troca de recebimento de vantagem econômica, de tomar providências, junto à Prefeitura do Município de Santo André, para que fosse satisfeito o crédito da empresa "Enterpa".

Destaca a denúncia, inclusive, que o paciente acabou por estabelecer contato com Ronan Maria Pinto que, a seu turno, retransmitiu o plano a Sérgio Gomes da Silva, o qual, "finalmente, providenciou o necessário para o assunto chegar ao Prefeito de Santo André, Celso Daniel, que aderiu ao plano" (fls. 45/46).

Impende registrar que tais fatos, segundo se colhe da narrativa da peça acusatória, operaram-se quando estavam em tramitação as ações judiciais deflagradas pela empresa "Enterpa" contra o Município de Santo André (nº 3129/99, da 1ª Vara Cível; nº 3023/99, da 4ª Vara Cível; nº 3224/99, da 4ª Vara Cível, todas da Comarca de Santo André/SP).

Daí por se concluir, ao contrário do que sustenta a impetração, que seria possível a prática, em tese, de ato tendente a influenciar a Prefeitura de Santo André no sentido de que os débitos da Municipalidade com a empresa Enterpa fossem satisfeitos por meio de acordo judicial.

E diga-se, nesse passo, consoante registra a denúncia, que, das sucessivas reuniões entre o paciente, Ronan Maria Pinto e Sérgio Gomes da Silva, a Prefeitura acabou realmente por firmar acordo judicial com Manoel Basto Lima Junior, comprometendo-se ao pagamento de seis milhões de reais, dos quais um milhão e quatrocentos mil seriam repassados à empresa Rovip S/A, da qual o paciente é sócio gerente.

Ora, é bem verdade que o recebimento da quantia indevida pelo paciente se efetivou posteriormente, isto é, somente após a homologação do referido acordo judicial.

Contudo, para efeito de configuração, em tese, do crime de tráfico de influência, pouco importa o momento do recebimento da vantagem econômica indevida, a qual pode se dar inclusive em momento futuro. O que verdadeiramente importa é o instante em que o agente criminoso se interpõe como suposto influenciador de ato de funcionário público. E, no caso, o paciente se apresentou a Manuel Basto Lima Junior quando ainda tramitavam as mencionadas ações cíveis, sequer anunciada a existência de algum acordo entre as partes.

Em verdade, perde relevância o momento da obtenção da vantagem econômica indevida, já que o delito previsto no art. 332 (tráfico de influência) é de ação múltipla ou conteúdo variado, contentando-se, nas modalidades formais, com a simples solicitação, exigência ou cobrança do proveito, em troca da suposta influência em ato funcional.

Tenho, nesse contexto, que a peça vestibular preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, descrevendo, com todas as suas circunstâncias, a existência de crime em tese, bem como a respectiva autoria, com indícios suficientes para a deflagração da persecução penal.

Guilherme de Souza Nucci, parafraseando o disposto no art. 239 do Código de Processo Penal, conceitua indício como "um fato secundário, conhecido e provado, que, tendo relação com o fato principal, autoriza, por raciocínio indutivo-dedutivo, a conclusão da existência de outro fato secundário ou outra circunstância. É prova indireta, embora não tenha, por causa disso, menor valia." (Código de Processo Penal Comentado, 9ª ed., p. 520).

Na espécie, aponto, por oportuno, os seguintes indícios que consubstanciam a justa causa para a deflagração da ação penal aqui tratada:

I) As sucessivas reuniões realizadas entre o paciente e Manuel Basto Lima Júnior, representante da empresa Enterpa, bem assim com Sérgio e Daniel, pessoas ligadas ao Prefeito Celso Daniel.

II) A conclusão de acordo judicial firmado entre a empresa Enterpa e o Município de Santo André (fls. 111/114), comprometendo-se este ao repasse de seis milhões de reais, divididos em seis parcelas fixadas no valor de um milhão, à conta do Banco BVA pertencente ao paciente, representante da empresa Rovip S/A.

III) A suposta inobservância pela Prefeitura de Santo André de procedimento administrativo regular, de molde a perquirir a viabilidade legal e financeira do dito acordo judicial, fato que culminou, inclusive, no ajuizamento de medida cautelar (fls. 117/125) por pessoas que se viram preteridas na satisfação de precatório de natureza alimentar, por conta da anulação da respectiva dotação orçamentária.

Segundo a iterativa jurisprudência desta Corte, o trancamento da ação penal, pela via do habeas corpus, é medida excepcional, só admissível quando despontada dos autos, de forma inequívoca, a ausência de indícios de autoria ou materialidade delitiva, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade.

Confiram-se, da nossa jurisprudência:

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PACIENTE DENUNCIADO SOB A ACUSAÇÃO DE INFRINGIR O ART. 302 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INEXISTÊNCIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE.

1. Cotejando o tipo penal incriminador indicado pela denúncia com a conduta supostamente atribuível ao Paciente, vê-se que, conquanto sucinta, a acusação atende aos requisitos legais do art. 41 do Código de Processo Penal, de forma suficiente para a deflagração da ação penal, bem assim para o pleno exercício de sua defesa.

2. "O reconhecimento da inocorrência de justa causa para a persecução penal, embora cabível em sede de 'habeas corpus', reveste-se de caráter excepcional. Para que tal se revele possível, impõe-se que inexista qualquer situação de iliquidez ou de dúvida objetiva quanto aos fatos subjacentes à acusação penal" (STF - HC 94.592/SP, 2.ª Turma, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJe de 02/04/2009).

Na hipótese, ao contrário, há indícios nos autos de que os fatos ocorreram como descritos na denúncia, razão pela qual não há justificativa para o trancamento da ação penal.

3. Habeas corpus indeferido.

(HC nº 140.330/RS, Relatora a Ministra Laurita Vaz, DJe de 15/12/09)

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS - CRIME DO ARTIGO 273, § 1º-B, VI, E § 2º, DO CÓDIGO PENAL - TRANCAMENTO - INÉPCIA DA DENÚNCIA - ERRO DE TIPO - AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA - INOCORRÊNCIA - PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA PELA PENA EM PERSPECTIVA - IMPOSSIBILIDADE - NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.

O trancamento da ação penal por esta via justifica-se somente quando verificadas, de plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria e prova da materialidade, o que não se vislumbra na hipótese dos autos.

Não há que se falar em trancamento de ação penal iniciada por denúncia que satisfaz todos os requisitos do art. 41 do CPP, sendo mister a elucidação dos fatos em tese delituosos descritos na vestibular acusatória à luz do contraditório e da ampla defesa, durante o regular curso da instrução criminal.

O pedido de reconhecimento de erro de tipo, que evidencia necessária incursão profunda nas provas dos autos, não pode ser analisado em vias de habeas corpus.

Não se aplica a prescrição da pretensão punitiva tomando como base a pena em perspectiva, mas somente pela pena concretamente aplicada ou pelo seu máximo possível.

Negado provimento ao recurso.

(RHC nº 21.470/RS, Relatora a Desembargadora convocada Jane Silva, DJ de 26/11/07)

PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME AMBIENTAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO-OCORRÊNCIA. PEÇA QUE NARRA O FATO E SUAS CIRCUNSTÂNCIAS. NÃO-INDICAÇÃO DE CONDUTA ILÍCITA. ANÁLISE PROBATÓRIA INVIÁVEL NO ÂMBITO ESTREITO DO WRIT. RECURSO IMPROVIDO.

1. O habeas corpus não se presta, como instrumento processual, para exame da procedência ou improcedência da acusação, com incursões em aspectos que demandam dilação probatória e valoração do conjunto de provas produzidas, o que só poderá ser feito após o encerramento da instrução criminal, sob pena de violação ao princípio do devido processo legal.

2. O trancamento de ação penal em sede de habeas corpus reveste-se sempre de excepcionalidade, somente admitido nos casos de absoluta evidência de que, nem mesmo em tese, o fato imputado constitui crime.

3. Não se configura inepta a denúncia que atende aos requisitos legais previstos no art. 41 do Código de Processo Penal, quais sejam, a exposição do fato criminoso, narrando todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a tipificação dos delitos por ele cometido.

4. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não se exige, na primeira fase da persecutio criminis, que a autoria e a materialidade da prática de um delito sejam definitivamente provadas, uma vez que a verificação de justa causa para a ação penal pauta-se em juízo de probabilidade, e não de certeza.

5. Recurso improvido.

(RHC nº 19.103/ES, Relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe de 31/8/09)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DUPLO HOMICÍDIO QUALIFICADO. ANULAÇÃO DO PROCESSO CRIMINAL POR SUSPEIÇÃO DE MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL POR INÉPCIA DA DENÚNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. ORDEM DENEGADA.

1. "A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia" (Súmula nº 234/STJ). Precedente do

STF: RHC 83.991/MG, DJ 7/5/2004.

2. O fato de membro do Ministério Público informar o rumo das investigações por meio de entrevista jornalística, mesmo que de forma enfática, não se encaixa nas hipóteses de suspeição, que, por força do art. 258 do Código de Processo Penal, encontram-se elencadas no art. 254 do referido diploma legal.

3. Não há que se falar em inépcia da peça acusatória que contém a exposição do fato criminoso, as suas circunstâncias, a qualificação do acusado, a classificação do crime e o rol de testemunhas, permitindo ao acusado o exercício da ampla defesa, atendendo ao disposto no art. 41 do Código de Processo Penal.

4. Por fim, segundo pacífico magistério jurisprudencial, em sede de habeas corpus, só é possível trancar ação penal em situações muito especiais, seja porque o fato narrado não constitui crime, seja porque é evidente e indiscutível a negativa de autoria, ou quando já estiver extinta a punibilidade, que são as hipóteses de rejeição da denúncia, nos termos do art. 43 do Código de Processo Penal.

5. Ordem denegada.

(HC 38.087/SP, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 20.6.05)

Nesse passo, não constato, pela leitura da narrativa contida na denúncia, a existência de algum vício apto a causar, em algum momento, prejuízo ao exercício do direito de defesa do paciente.

Por outro lado, o exame detalhado da prova é incabível em habeas corpus, ação de índole constitucional destinada à salvaguarda da liberdade de locomoção quando despontada a existência de ilegalidade ou abuso de poder, inocorrentes na espécie.

Pelo exposto, não vislumbrando a existência de constrangimento ilegal, denego o habeas corpus.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2009/0169598-8 HC 146038 / SP

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 11987903 17212007 5540120070457680 993080214468

EM MESA JULGADO: 02/03/2010

Relator
Exmo. Sr. Ministro OG FERNANDES

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EDUARDO ANTÔNIO DANTAS NOBRE

Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: LUIZ CARLOS MARANHÃO E OUTRO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: JOSÉ AUGUSTO FERREIRA DOS SANTOS

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Praticados por Particular Contra a Administração em Geral - Tráfico de influência

SUSTENTAÇÃO ORAL

Dr(a). LUIZ CARLOS H DE A MARANHÃO, pela parte PACIENTE: JOSÉ AUGUSTO FERREIRA DOS SANTOS

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Após o voto do Sr. Ministro Relator denegando a ordem, pediu vista o Sr. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP). Aguardam os Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura."

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 02 de março de 2010

ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
Secretário

HABEAS CORPUS Nº 146.038 - SP (2009/0169598-8)

RELATOR: MINISTRO OG FERNANDES

IMPETRANTE: LUIZ CARLOS MARANHÃO E OUTRO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: JOSÉ AUGUSTO FERREIRA DOS SANTOS

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP): Em memorial, o ilustre impetrante destaca:

- no habeas corpus se pede o trancamento da ação penal, porque (a) é evidentemente atípico o fato imputado ao paciente, e (b) é manifestamente inepta a denúncia contra ele ofertada, na qual o órgão acusador omitiu a descrição de circunstância essencial à configuração do suposto delito (art. 332, C.P.).

- a atipicidade está em que a obtenção da suposta "vantagem" que se atribuiu ao paciente só ocorreu depois de praticado o ato funcional ( a celebração do acordo com a Prefeitura), como informou o próprio particular, ouvido pelo M.P. (fls. 23/25, anexo "2").

Estas afirmações não estão corretas.

De feito, a leitura da denúncia permite concluir que a imputação fática se refere à prática do delito descrito no preceito primário do tipo do artigo 332 do Código Penal, pois afirma categoricamente:

José Augusto, após reunião com Manuel, em troca de recebimento de vantagem para sua empresa, se comprometeu a providenciar o quanto necessário para que a Prefeitura de Santo André efetuasse o pagamento do débito.

A esta altura, já era do conhecimento de José Augusto a relação de amizade e influência entre Ronan e Sérgio, bem como era do seu conhecimento a mesma relação de amizade e influência entre Sérgio e o então Prefeito Celso Daniel. Diante disto, José Augusto transmitiu o resultado da reunião a Ronan. Este, por seu turno, retransmitiu o plano para Sérgio. Sérgio, finalmente, providenciou o necessário para o assunto chegar ao Prefeito de Santo André, Celso Daniel, que aderiu ao plano.

Não é preciso, de tal arte, muito esforço de raciocínio, para compreender que o paciente está acusado de ter intermediado plano para obter vantagem a terceiro, influindo em ato praticado pelo Prefeito Celso Daniel.

E a vantagem foi efetivamente obtida, acordo judicial para pagamento da importância de seis milhões de reais à empresa "Rovip S/A", sucessora da "Enterpa", esta figurando como autora originária nas ações em face da Prefeitura de Santo André. O pagamento foi assim distribuído: para a "Enterpa", R$ 4.600.000,00 (quatro milhões e seiscentos mil reais); e para a "Rovip", R$ 1.400.000,00 (um milhão e quatrocentos mil reais).

A denúncia ainda destacou ponto vital: o acordo para o pagamento dos seis milhões de reais não obedecera aos trâmites normais, porquanto não precedido de nenhum procedimento administrativo que pudesse colher parecer dos procuradores do município sobre a viabilidade legal e financeira, de modo que o documento fora elaborado por ordens do próprio Prefeito Celso Daniel.

Ora, se a denúncia narra que o paciente assumira compromisso com Manoel Basto Lima Junior, em troca de recebimento de vantagem econômica, de tomar providências junto ao Prefeito Celso Daniel para que fosse satisfeito o crédito da empresa "Enterpa", tal conduta se subsume, em princípio, ao preceito do artigo 332 do Código Penal, juízo de valor provisório, típico do habeas corpus. E a ele se chega, por força do princípio consubstanciado no brocardo id quod plerumque accidit, pois não seria gratuitamente que o Município de Santo André pagaria importância de seis milhões de reais, em detrimento de outros credores portadores de precatórios de natureza alimentar. O eminente Relator ressaltou, aliás, que medida cautelar fora ajuizada por pessoas que se viram preteridas na satisfação de precatório de natureza alimentar, por conta da anulação da respectiva dotação orçamentária.

Por outro lado, embora busque a impetração dizer atípica a conduta do paciente por ter recebido vantagem depois da homologação judicial, tal circunstância é absolutamente irrelevante para desfazimento do ilícito penal. Isto, porque, como anotou Celso Delmanto, a consumação se dá com "a efetiva solicitação, exigência, cobrança ou obtenção da vantagem ou promessa desta, sem necessidade de outro resultado" (cf. "Código Penal Comentado", pág.832).

Aliás, a consumação independe do efetivo recebimento da vantagem, bastando que o agente obtenha a promessa dela para estar consumado o crime do art. 332, conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal, em decisão por maioria de votos (cf. RTJ 117/572).

O eminente Relator, Ministro Og Fernandes, expôs com meridiana clareza e acerto:

O que verdadeiramente importa é o instante em que o agente criminoso se interpõe como suposto influenciador de ato de funcionário público. E, no caso, o paciente se apresentou a Manuel Basto Lima Junior quando ainda tramitavam as mencionadas ações cíveis sequer anunciada a existência de algum acordo entre as partes.

O nomen iuris desse delito era exploração de prestígio e foi pela Lei n° 9.127, de 16.11.1995 alterado para tráfico de influência. A respeito da antiga redação do artigo 332 do Código Penal, ainda hoje é válido o seguinte comentário de Nélson Hungria, Comentários ao Código Penal, 1959, v. IX, p. 427:

O agente atribui-se, persuasivamente, influência sobre o funcionário, comprometendo-se a exercê-la em favor de interessado perante a administração pública.

Não tenho, pois, dúvida em acompanhar o voto do eminente Relator, pelo que também denego a ordem.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2009/0169598-8 HC 146038 / SP

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 11987903 17212007 5540120070457680 993080214468

EM MESA JULGADO: 13/04/2010

Relator
Exmo. Sr. Ministro OG FERNANDES

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MOACIR MENDES DE SOUSA

Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: LUIZ CARLOS MARANHÃO E OUTRO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: JOSÉ AUGUSTO FERREIRA DOS SANTOS

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Praticados por Particular Contra a Administração em Geral - Tráfico de influência

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Prosseguindo no julgamento após voto vista do Sr. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP) denegando a ordem, e os votos dos Srs. Ministros Haroldo Rodrigues, Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura no mesmo sentido, a Turma, por unanimidade, denegou a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 13 de abril de 2010

ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
Secretário

Documento: 947726 Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 10/05/2010




JURID - HC. Tráfico de influência. Pedido de trancamento da ação. [10/05/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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